segunda-feira, 11 de agosto de 2014

O MILAGRE DE JUAZEIRO (Fernando Maia da Nóbrega)

           
No ano do centenário de morte da Beata Maria de Araújo, bem como, decorridos oitenta anos do falecimento do Padre Cícero Romão Batista, é oportuno se debruçar sobre os pretensos milagres ocorridos em Juazeiro do Norte, a partir de 1889, envolvendo os dois protagonistas desses fatos.
       Muito embora haja farta literatura abrangendo o assunto, a história real, verdadeira, ainda é bastante distorcida pelo público, gerando falsas interpretações e julgamentos tendenciosos, mormente por pessoas não especializadas na matéria, justificando, destarte, mais uma abordagem.
      Tudo teve início em 1º de março de 1889. Após exaustivo dia de confissões e comunhões, Padre Cícero ao ministrar a eucaristia à beata Maria Magdalena do Espírito Santo Araújo, constatou estupefato que a hóstia consagrada havia se transformado em sangue! Diante da gravidade do assunto o reverendo achou por bem silenciar. Entretanto, Monsenhor Francisco Rodrigues Monteiro, contrariando os desejos do Padre Cícero, divulgou oficialmente perante mais de três mil pessoas assistentes de uma missa, na Igreja de Nossa Senhora das Dores, em Juazeiro do Norte, os acontecimentos extraordinários ocorridos anteriormente. Durante o ato litúrgico o reverendo exibiu aos atônitos fiéis as toalhas tintas de sangue!
            A notícia se espalhou rapidamente por todo o nordeste brasileiro atraindo milhares de romeiros a Juazeiro. Em Iº de maio de 1891, 20 mil pessoas presentes à missa realizada na matriz de Juazeiro assistiram ao momento em que a hóstia, novamente em contato com a boca da Beata, se transformou em sangue! Entre todos se destacava um médico do Rio de janeiro, Dr. Marcos Madeira, que clinicou imediatamente Maria de Araújo, a qual  apresentava um estado de êxtase, total arrebatamento espiritual, e de sua boca entreaberta, foi retirada a partícula de massa, ministrada na eucaristia, com marcas de sangue. Verificou também o médico que no corpo da Beata havia feridas sanguíneas nos pés, mãos, nas vértebras dorsais e  testa. Para espanto de todos, do corpo de Maria de Araújo brotava sangue nos mesmos lugares do Cristo crucificado!  Um milagre divino em pleno sertão nordestino!
            Contrariando a expectativa geral, em 18 de novembro de 1891, a Igreja Católica se pronunciava sobre os fenômenos ocorridos em Juazeiro, taxando-os de enganosos e falsos e não aceitando como científico o laudo emitido pelo Dr. Marcos Madeira  afirmando que Beata não estava doente e garantia que a aparição da hóstia era “(...) um fato sobrenatural para o qual não me foi possível encontrar explicação científica (...)”.
            Vale ressaltar que Dom Joaquim, Bispo da Diocese do Ceará, enviou para Juazeiro uma Comissão de Inquérito com o intuito de apurar os fatos ocorridos e foi constatada pelos integrantes a veracidade absoluta dos fenômenos sucedidos. Inconformado, Dom Joaquim mandou uma segunda inquisitiva que chegou ao resultado aspirado pelo Reverendo negando, desta forma, a possibilidade de manifestação milagrosa.
            Daí em diante a repressão eclesiástica se fez presente. No dia 10 de novembro de 1891, uma portaria de Dom Joaquim proibia a todos os sacerdotes de sua jurisdição de confessar, pregar e celebrar qualquer festa religiosa na cidade de Juazeiro.
            Já em 1897, a Igreja católica ameaçava o Padre Cícero de excomunhão caso não se retirasse do povoado no prazo de 10(dez) dias.
            Por fim, veio a palavra final da Igreja através da Suprema Congregação da Santa inquisição Romana Universal condenando definitivamente os milagres em Juazeiro.
            Hoje, cento e vinte anos após a ocorrência dos pretensos milagres, cem anos depois o falecimento da Beata, a Igreja ainda reluta em aceitar a transformação da hóstia em sangue e os estigmas de Maria de Araújo como milagre. Ainda é difícil a Igreja concordar que Deus possa ter se manifestado a um povo subdesenvolvido... Ela aceita como milagroso qualquer fato inexplicável e provado... se ocorrido na Europa.
             O povo, porém, teve a coragem de santificar um homem, o Padre Cícero, que um século antes da própria Igreja fez a opção pelos pobres. O povo teve a ousadia de cultuar uma mulher analfabeta, negra, no caso, Maria de Araújo.  Quem pode duvidar? Afinal como disse o Profeta Isaías 43;13 “Agindo Deus quem impedirá?