DEPOIMENTOS

DEPOIMENTOS SOBRE PADRE CÍCERO

PADRE CÍCERO ERA UMA PESSOA CULTA?

Antônio de Alencar Araripe, escritor: "Nas centenas de vezes em que estive em sua residência, onde inexistia biblioteca... aí permanecendo horas a fio, nunca o vi ler qualquer livro, fascículo ou jornal, nem se referir ao respectivo conteúdo, a não ser quando remontava ao seu tempo de estudante ou professor". (1)

Jáder de Carvalho, escritor: "Padre Cícero não era o homem culto que muita gente, ainda hoje apregoa... Jamais lhe descobri qualquer traço de intelectualidade". (2)

Edmar Morel, jornalista: "Desgraçadamente o Padre Cícero não tem amor pelo saber, nem culto à literatura. Sempre viveu alheio aos livros e sem a amizade de homens de valor cultural. Era um ignorante, sem cultura, mesmo no campo religioso". (3)

Luís Sucupira, escritor: "Padre Cícero era possuidor de elevada cultura para seu tempo, tendo adquirido um lastro bem sólido de conhecimentos intelectuais, como ótimo aluno que foi de História, Geografia e Teologia no Seminário de Fortaleza". (4)

Cândido Mariano da Silva Rondon, militar: "O Padre Cícero tem palestra interessante de letrado. Fala com fluência sobre História, Literatura e Política, discreteando sobre a vida nacional, cujas tricas conhece palmo a palmo". (5)

Phillip Von Luetzelberg, naturalista: "Padre Cícero é um homem que dispõe de instrução e saber invulgares. Aborda com igual facilidade a política e a história brasileira; tem conhecimentos profundos de história universal, ciências naturais, especialmente quanto à agricultura". (6)

Amália Xavier de Oliveira, educadora e escritora: "Os assuntos de suas palestras eram sempre edificantes; jamais uma conversa fútil e muito menos leviana". (7)

QUAL A CONTRIBUIÇÃO DE PADRE CÍCERO PARA A EDUCAÇÃO EM JUAZEIRO?

Lourenço Filho, educador e escritor: "Padre Cícero nunca se interessou pela instrução e até a tem embaraçado algumas vezes". (8)

Jáder de Carvalho, escritor: "Tive vários encontros com o Padre Cícero. Dele jamais consegui um prédio para a instalação de uma escola". (9)

Otacílio Anselmo, militar e escritor: "Para um povo carente de instrução, não fundou escolas. Aliás, sua aversão ao ensino foi comprovada em 1922, ocasião em que, como Prefeito Municipal, não permitiu a instalação de um grupo escolar em Juazeiro". (1O)

Edmar Morel, jornalista: "Esperava-se, pelo seu contato com os grandes centros científicos, num País onde o Rei dirigia uma cruzada de alfabetização, que o Padre Cícero, ao chegar no Juazeiro, cuidasse de abrir escolas primárias e mandasse buscar na capital professores experimentados. O capelão não faz nada no terreno educacional. Populações inteiras vivem na ignorância. Só sabem desfiar o rosário nos dedos e cantar benditos... A ele interessa este lamentável estado de cousas. Tivesse um espírito culto, progressista e teria prestado um relevante serviço ao Brasil, abrindo escolas para a infância, orfanatos e colégios". Na verdade, abandona o problema educacional, para ser personagem principal de um ciclo lendário de crendices religiosas". (11)

Amália Xavier de Oliveira, educadora e escritora: "O que foi possível fazer o Padre Cícero fez: fundou algumas escolas particulares, gratificando, do próprio bolso, alguns professores quando as mensalidades recebidas não cobriam suas despesas com a manutenção. Em 1896, graças a sua iniciativa foi instalada a escola feminina, sob a regência da Professora Isabel Montezuma da Luz. O Orfanato Jesus Maria José, iniciado nesta cidade em 1916, teve como fundador o Padre Cícero, coadjuvado por Joana Tertuliana de Jesus. O fim desta instituição que ainda hoje existe funcionando com as mesmas finalidades, foi amparar as crianças do sexo feminino, pobres e órfãos, dando-lhes uma educação adequada capaz de lhes garantir viver honestamente, quando pela idade ou outras circunstâncias tiverem que deixar a tutela da entidade de sua formação. A Associação dos Empregados do Comércio de Juazeiro, fundada no dia 3 de julho de 1926 sob os auspícios do Padre Cícero, desde a sua fundação teve como objetivo principal a instrução primária dos sócios e de seus dependentes". (12)

Azarias Sobreira, sacerdote e escritor: "Não é de hoje que se vem dizendo, ordinariamente com segundas intenções, ser o Patriarca de Juazeiro um obscurantista, figadal inimigo da alfabetização do seu povo. Se, entretanto, nos dermos ao paciente esforço de tirar a limpo essa tese sustentada com indisfarçável ênfase, esbarraremos em ilações diametralmente opostas. É que contra fatos a mancheias não podem prevalecer argumentos. Bem ao contrário do que se tem dito, às vezes de oitiva, o Padre Cícero viveu sempre idealizando a felicidade e, portanto, a alfabetização de sua gente, na maior escala possível. Apenas se fixou em Juazeiro, embora ali já funcionasse uma escola, andou dando aulas particulares a um ou outro rapazito que lhe pareceram com alguma aptidão e gosto para aprender". (13)

Fernandes Távora, médico, político e escritor: "O meu ilustre amigo Lourenço Filho afirma que não pôde conseguir a boa vontade do Padre Cícero no sentido de incrementar a instrução primária em Juazeiro. Eis outro paradoxo aparente, só compreensível e explicável pelos que conheceram intimamente os homens e as coisas daquela terra. Padre Cícero sempre amou a instrução e desejou vê-la difundida em sua cidade, como poderão dar testemunho diversos moços que, a expensas dele, se educaram desde a escola primária até os cursos superiores. Se não atendeu ao esforçado e digno Diretor da Instrução Pública do Ceará, terá sido por causa estranha à sua vontade". (14)

Neri Feitosa, sacerdote e escritor: "Padre Cícero fez as duas coisas: instruiu e educou seu povo. Quanto à instrução, o Padre Cícero fez de Juazeiro um modelo". (15)

Antônio Teixeira Junior, jornalista: "Padre Cícero preocupou-se com escolas a ponto de no seu testamento legar todos os seus bens aos Salesianos, com a condição de esses religiosos construírem um colégio". (16)

ERA O PADRE CÍCERO UM PARANÓICO?

Nertan Macedo, jornalista e escritor: "As quatro pastorais do bispo Dom Joaquim, sábias e incisivas, de condenação ao milagre da beata Maria de Araújo, feriram profundamente o Padre do Juazeiro: na sua paranóia, crença e amor-próprio." (17)

Helvídio Martins Maia, sacerdote e escritor: "Após examinarmos, cuidadosamente, o pronunciamento de teólogos e cientistas, consideramos o Padre Cícero um paranóico de fundo místico e não um louco". (18)

Fernandes Távora, médico, político e escritor: "Se analisarmos, com atenção, a vida do Padre Cícero, verificaremos que ela foi sempre deficiente, não só em relação à mentalidade, como a outras funções fisiológicas. Bastariam, para justificar esta asserção, os constantes êxtases em que caía, durante horas, e a sua absoluta castidade, ou melhor, frigidez, por todos propalada. E, realmente, nunca houve quem lobrigasse, na longa vida do velho sacerdote, a sombra de uma mulher... Foi nesse organismo mioprágico que o choque profundo do desentendimento com as autoridades eclesiásticas evidenciou a paranóia. Eu não encontro motivos para discrepar do que formulei, há tantos anos e agora reitero, com integral convicção". (Depoimento de 1943). (19)

Fernandes Távora: "Padre Cícero era um homem de ótimas qualidades morais, e estas nunca deixaram de manifestar-se no decurso de sua vida patológica: não esqueceu velhas amizades; dava esmolas; educava, por sua conta, grande número de moços pobres...". (Depoimento de 1961). (20)

José Leite Maranhão, psiquiatra e professor: "O Padre Cícero teve uma personalidade normal, o seu psiquismo foi hígido e equilibrado com raro poder de autocrítica e inteligência. Sei que é temeroso avançar esta afirmação, numa espécie de perícia póstuma, para juízo dos homens cultos, à luz da ciência e da sociologia. É, todavia, um dever de quem o conheceu de perto e acompanhou a sua projeção na história, restabelecer a verdade numa visão histórica serena e científica à luz da psicologia e percepção sociológica. Posso, pois, afirmar: o Padre Cícero não é paranóico. Como definir a personalidade do Patriarca? Dentro da classificação biopatológica de Kretschmer, aliás, da escola alemã, o Padre Cícero é um ciclóide, biótipo admiravelmente caracterizado na sua organização psicossomática, e na confluência dos fenômenos sociais, políticos e religiosos que o envolveram. O Padre Cícero não é paranóico". (21)

Antônio Teles, médico e escritor: "Inimigo político, de longa data, do Patriarca, a quem, muitas vezes, atacou ferozmente pela imprensa, até injustamente, como ele próprio reconhece, e outrora partidário fanático do Coronel Franco Rabelo apeado do poder pelos bacamartes dos romeiros do Padre Cícero, o Sr. Fernandes Távora jamais lhe perdoou a deposição do seu antigo chefe e atirou-lhe, por isso, a pecha de paranóico, como um ajuste de contas póstumo. O diagnóstico de paranóia não se coaduna com o comportamento do Padre Cícero, todo ele balizado pelos princípios evangélicos da humildade, da abnegação e do amor ao próximo". (22)

Abelardo F. Montenegro, advogado, professor e escritor: "Padre Cícero não era um paranóico, um megalomaníaco ou um paciente digno de um consultório psicanalítico. Mas, sim, um psicólogo que conhecia perfeitamente o meio e o homem do sertão". (23)

PADRE CÍCERO FOI HERESIARCA?

Euclides da Cunha, escritor: "Padre Cícero é um heresiarca sinistro". (24)

Otacílio Anselmo, militar e escritor: "Inegavelmente, o Padre Cícero começou bem... Só depois, numa progressão lenta, mas continuada, ele mudou de rumo, dando um sentido nebuloso ao seu sacerdócio, para finalmente transformá-lo em heresia, movido pelo impulso de pendores ancestrais (recorde-se que o pai era mitômano) e pela influência decisiva do primo e inseparável amigo José Marrocos". (25)

Manuel Diniz, advogado, educador e escritor: "Heresiarca por que, se Padre Cícero jamais deixou de obedecer até mesmo ao zelo inexplicável dos seus superiores?". (26)

José de Medeiros Delgado, arcebispo e escritor: "Padre Cícero teve mil oportunidades para ser um heresiarca e não o foi. Pôde erguer o estandarte do cisma e não o fez". (27)

PADRE CÍCERO FOI LÍDER?

Leandro Konder, escritor: "Padre Cícero era um líder de massas comprometido com o atraso das massas que liderava". (28)

Helvídio Martins Maia, sacerdote e escritor: "Padre Cícero era um líder de fanáticos". (29)

Ayres de Montalvo, escritor: "Padre Cícero foi o maior líder natural que já deu o nosso povo. Um líder verdadeiro a cuja influência bem pouca gente pôde ficar indiferente: ou o amava ou o odiava". (30)

Napoleão Tavares Neves, médico e escritor: "Padre Cícero foi, inquestionavelmente, um grande líder popular e religioso, líder realmente carismático, com uma extraordinária visão do futuro e uma ímpar capacidade de prever para tentar prover". (31)

Neri Feitosa, sacerdote e escritor: "No Brasil, não consta que alguém já tenha tido uma liderança maior e mais duradoura que a do Padre Cícero". (32)

PADRE CÍCERO É SANTO?

Rodolpho Theóphilo, escritor: "Padre Cícero se passava por santo". (33)

Hélder Câmara, arcebispo e escritor: "Faltou competência à Igreja Brasileira para canonizá-lo, mas santo ele era". (34)

Raquel de Queiroz, escritora: "Padre Cícero é o nosso santo". (35)

Antoine Vergote, sacerdote, filósofo e psicanalista: “Pessoalmente, considero-o um padre santo. Lamento que as autoridades da Igreja tenham sido mal informadas a seu respeito e espero que elas reconheçam, um dia, oficialmente, o valor humano e religioso excepcional desse padre”(36).

Sebastião Negreiro, jornalista: "Padre Cícero foi o santo que abalou os sertões". (37)

Hermínio B. de Oliveira,  sacerdote e escritor: "O Padre Cícero é um desses santos populares, canonizado pelo povo, como muitos por aí. É tido como alguém que viveu entre eles, que conheceu suas necessidades e com quem eles se identificam e em quem podem confiar. Isto explica a veneração do nordestino à sua pessoa". (38)

PADRE CÍCERO PODE SER CHAMADO DE CORONEL?

Maria de Lourdes M. Janotti, escritora: "Padre Cícero foi o mais célebre de todos os coronéis". (39)

José Fábio Barbosa da Silva, professor e escritor: "Padre Cícero também era o coronel dono de imensa força política que passou a representar os romeiros, quando Juazeiro se tornou independente. O Padre Cícero também possuía o status mais elevado, mais alto que o dos coronéis tradicionais". (40)
Rui Facó, jornalista: "Por que o Padre Cícero desfrutando de enorme popularidade, dispondo de tudo quanto fazia de alguém um coronel, por que não seria ele um coronel? Apenas porque vestia batina, ordenara-se padre, fazia milagres? Na verdade, nada diferenciava o Padre Cícero Romão Batista de qualquer dos latifundiários da zona. Utilizou, e em grande escala, os mesmos métodos familiares àqueles, como dar abrigo a capangas e cangaceiros e aproveitá-los ou permitir que outrem os aproveitassem para a consecução de objetivos políticos que também eram os seus". (41)

José Boaventura de Sousa, historiador e professor: "Padre Cícero foi um coronel, mas um coronel diferente da conotação que a sociologia aponta. Não foi um coronel explorador, foi um coronel porque todos o procuravam como um líder". (42)

Francisco Régis Lopes Ramos, historiador e escritor: "Padre Cícero alia-se aos coronéis, mas não se torna um deles. Suas atitudes são de apadrinhamento, de um protetor dos desclassificados, de um conselheiro e não de um político ou coronel". (43)

Neri Feitosa, sacerdote e escritor: "Ele não tinha patente militar nem da Guarda Nacional. Ninguém o chamou oralmente de coronel. Por escrito, deram-lhe este epíteto por hipérbole e por analogia". (44)

Daniel Walker, professor e escritor: "A pecha de coronel, no sentido como o termo é usado e entendido no Nordeste, não se coaduna com o comportamento e a personalidade do Padre Cícero. Ninguém conhece registro da existência de armas em sua casa ou de capangas a sua disposição, coisas muito comuns aos coronéis de que fala a literatura". (45)


QUE PARTICIPAÇÃO TEVE O PADRE CÍCERO NA REVOLUÇÃO DE 1914?

Otacílio Anselmo, militar e escritor: "O movimento armado foi organizado por Floro e liderado pelo Padre Cícero. Deflagrado o movimento, o Padre Cícero pretendeu estendê-lo a outros municípios. Neste intuito mandou Floro e Pedro Silvino a Missão Velha, à frente de numerosa comitiva armada, onde esperava receber a adesão de Domingos Furtado, José Inácio e Manoel Chicote". (46)

Rodolpho Theophilo, escritor: "O Padre Cícero esperava o momento oportuno para insurgir-se contra o governo do Estado. Manhoso e precavido, ia contemporizando, sujeitando-se a certas exigências dos poderes públicos dentro dos seus Domínios, à espera da ordem de ataque do Rio de Janeiro. Não precisava ser muito arguto para verificar que o Padre Cícero agia de comum acordo com o Governo Federal. Caso a deposição de Franco Rabelo não pudesse ser feita em Fortaleza pelos marretas, começaria por um movimento sedicioso em Juazeiro, promovido pelo Padre Cícero Romão Batista, e viria sobre a capital do Estado. (47)

Edmar Morel, jornalista e escritor: "O Padre Cícero arquitetou uma revolução para alijar o coronel Franco Rabelo do governo... Franco Rabelo foi deposto pelos cangaceiros do Padre Cícero e Floro Bartolomeu, com o dinheiro fácil do Banco do Brasil, mandado pelo Senador Pinheiro Machado, o dono do País." (48)
Ralph Della Cava, historiador: "Contrariamente à maioria das interpretações tanto contemporâneas quanto atuais, parece certo que o Cel. Antônio Luís foi o arquiteto principal do plano no Cariri; Floro foi o executor-chefe e Padre Cícero, seu cúmplice atônito e indeciso. É hoje evidente que não poderia ter sido de outra forma. Antônio Luís, primo-irmão do ex-governador Accioly, chefe deposto do Crato, antigo deputado estadual e outro "Grande Eleitor" de todo o Vale do Cariri, era quem mais tinha a lucrar com a "revolução". Além disso, tratava-se de um político experiente, enquanto Floro não conhecia uma única personalidade política do Ceará e jamais estivera em Fortaleza! Somente depois de ter ido ao Rio de Janeiro, em agosto de 1913, travou relações com os Accioly, com o senador Cavalcante e com o próprio Pinheiro Machado! Admite-se que Antônio Luís e Floro não foram os únicos conspiradores. Havia, ainda, o imprevisível João Brígido, redator-chefe do jornal "O Unitário", a primeira pessoa a partir para o Rio de Janeiro em 1913 com o fim de conspirar contra o governo de Franco Rabelo." (49)

Irineu Pinheiro, médico e escritor: "Em seu testamento declarou o Padre Cícero de modo textual: "Não fiz revolução, nela não tomei parte, nem para ela concorri, nem tive, nem tenho a menor parcela de responsabilidade, direta ou indiretamente nos fatos ocorridos". Mas o que se pode afirmar é que sem o apoio do Padre Cícero não teria sido possível ao Dr. Floro, chefe ostensivo da revolução, conduzir de Juazeiro um romeiro sequer para enfrentar as forças legalistas daquele tempo". (50)

C. Livino de Carvalho, escritor: "Foi o Dr. Floro o inspirador e chefe absoluto da rebelião do Juazeiro, que, levada a bom termo, logrou derribar o governo estadual do coronel Franco Rabelo. Nessa empresa, de que recolheria honra e preitos, usou dos romeiros do Padre Cícero o qual lhe emprestava a força da própria influência e prestígio." (51)

Azarias Sobreira, padre e escritor: "Padre Cícero em tempo algum pretendeu armar sua gente contra quem quer que fosse. Norma invariável de seu viver até os setenta anos, sua política era toda de paz e boa vizinhança. Foi a chegada de Floro em 1908, a sua gradativa ascendência sobre o guia espiritual daquele aglomerado humano, que a tudo imprimiu nova diretriz. Foi Floro quem, ao apagar das luzes de 1913, acendeu o facho da rebelião popular, que teve por epílogo a deposição do Governador do Estado Marcos Franco Rabelo. Diga-se, entretanto, de passagem, que, se Franco Rabelo não houvesse sido inepto e desavisado, Juazeiro nunca teria pensado em pegar em armas para depô-lo. Porque é inegável que o militar que tinha então as rédeas do Governo Estadual, desde muito afastado no Sul do País, ignorava os anseios da alma cearense naquele agitado momento político. Certamente por isto, admitiu a seu conselho figuras inexpressivas e sem passado, sequiosas de reivindicações absurdas e ressumantes de malquerenças individuais. Dentre eles não faltava quem apontasse a destruição de Juazeiro como um fato digno de todos os louvores. Reduzir a cinzas a terra do Patriarca, eis o que se impunha. Afirmavam isto nas ruas de Fortaleza e seus partidários o repetiam pelo interior, criando, assim, no sertanejo conformista, paulatina predisposição para uma reação armada. Insuflados por tais mentores, rapazes situacionistas, porventura sob o incentivo de libações alcoólicas, faziam ruidosas serenatas, indo, às vezes, proferir expressões equívocas, em noites de luar, bem perto da residência do Padre Cícero.Enquanto isto, os políticos decaídos, sabedores de tudo e saudosos da administração Accioly recém-apeada do poder, instavam com Floro Bartolomeu no sentido de se desvencilhar de Franco Rabelo, prometendo-lhe irrestrito apoio do Governo Federal. Choviam argumentos sobre argumentos. Sucediam-se emissários do partido Acciolyno desarvorado, suplicando ao Padre Cícero que salvasse o Ceará daquele a quem chamavam déspota da demagogia. E já que ninguém dispunha de elementos e prestígio para empunhar o estandarte da inconfidência, que ele, Padre Cícero, não hesitasse em assumir tal decisão, ainda com sacrifício de seu passado de anjo da paz! Cedeu, enfim, o Patriarca, mas sem entusiasmo. Só o fez depois que lhe asseveraram, insistentemente, que não se faria preciso derramar sangue: bastaria reunir em Juazeiro os deputados dissidentes, armar algumas centenas de homens e declarar deposto o Governo do Ceará. "(52)

Amália Xavier de Oliveira, educadora e escritora: "Todo brasileiro, todo cearense, todo juazeirense, precisa saber que aquela revolução, que teve por palco Juazeiro do Padre Cícero pelo fato de haver rebentado aqui no dia 9 de dezembro de 1913, foi um movimento de ordem política, orientado e apoiado, material e moralmente pelos altos poderes da República e que, membros da alta cúpula política da oposição, deram ao Dr. Floro Bartolomeu, a incumbência de chefiá-la. Infelizmente ainda hoje há quem, ou por má fé, ou por não conhecer as causas da mesma revolução, dê a responsabilidade de tudo ao Padre Cícero. (53)

Floro Bartolomeu da Costa, médico, jornalista e político: "Será possível que não se saiba ainda hoje que fui eu o chefe da revolução do Juazeiro e o único responsável por ela? Já está por demais repisado este caso. Esse movimento que, por motivos de ordem especial, fiz irromper no Juazeiro, não foi nem podia ter sido sustentado somente por cangaceiros e por fervorosos adeptos daquele sacerdote, porquanto, com a causa que o determinou, estava grande parte da população cearense, constituída dos correligionários do grande partido em oposição ao governo.”(54)

PADRE CÍCERO DEU ALGUMA CONTRIBUIÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL?

Otacílio Anselmo, militar e escritor: "Enclausurado num recanto do sertão em contato apenas com tabaréus, o Pe. Cícero não poderia realizar a obra social e religiosa que lhe atribuem seus apologistas, isto porque lhe faltavam o equilíbrio mental, a cultura e a visão de um Ibiapina, por exemplo,”. (55)

Rui Facó, jornalista: "Padre Cícero contribuiu decisivamente para fomentar a agricultura no Cariri e fundou uma cidade que, poucos anos mais tarde, seria a segunda do Estado, depois da Capital". (56)

Irineu Pinheiro, médico e escritor: "Sem auxílio dos governos da União e do Estado, Padre Cícero canalizou espontaneamente para uma das porções mais férteis do Ceará uma intensa migração de elementos puramente nacionais, pacíficos e trabalhadores... Lucrou eminentemente o Cariri com a imigração dos romeiros. Sob esse ponto de vista foi o Padre Cícero - não há como duvidar - um dos maiores fatores de progresso da vida econômica sul cearense". (57)

Ariosto Holanda, político e professor: "Três preocupações orientaram a ação política do Padre Cícero: a) atacar de frente o problema das secas periódicas que flagelavam os sertões; b) industrialização do interior nordestino e c) transformação dos hábitos e costumes locais mediante educação do sertanejo. Inicia a construção de diversos açudes com a ajuda de mão-de-obra dos romeiros e depois vem atuar de maneira decisiva na criação e estruturação da antiga Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas junto com Arrojado Lisboa. Incentiva a construção de usinas de beneficiamento de algodão e outras leguminosas. Sonha com a produção de cobre na área do Coxá, tendo trazido engenheiro de minas da França para a realização de estudos de prospecção geológica do Cariri. Finalmente, entusiasmado com o que viu na Itália, sonha com a implantação de escolas profissionais salesianas, educando as populações sertanejas. Pode-se, contudo, constatar que a maior contribuição histórica do Padre Cícero para as mudanças estruturais do Ceará e do Nordeste foi a de conseguir transformar o modo de produção sertaneja, mediante a organização da produção artesanal, tirando sua característica de eventual e esporádica, dando-lhe um caráter permanente e profissionalizando o artesão”. (58)
Mário Souto Maior, escritor e etnólogo: "O problema habitacional mereceu, da parte do Padre Cícero, uma atenção toda especial". (59)

João Alves de Melo, economista: "Padre Cícero foi um dos primeiros cidadãos nordestinos a clamar pela Região. Clamar por melhores condições de vida. Clamar por educação. Clamar por verdadeiras oportunidades de trabalho. (60). Vejam estas características anotadas por diversos estudiosos: vigoroso propulsor do desenvolvimento; orientador e condutor investido de responsabilidade social; solidariedade, integração e ação comunitária; promoção do homem; planejamento de fábricas; contribuição ao desenvolvimento agrícola, econômico e cultural. Ninguém duvida que essas características sejam de uma instituição social, de desenvolvimento, como o Banco do Nordeste. Mas seus autores estavam se referindo ao Padre Cícero”. (61).

NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
01. Antônio de Alencar Araripe, O Padre Cícero I, in O Povo, de 29.12.1970, apud Helvídio Martins Maia, Pretensos Milagres em Juazeiro, Petrópolis, 1974, p. 52.
02. Jáder de Carvalho, A Gazeta de Notícias, de 22.7.1973, apud Helvídio Martins Maia, o.c. p. 52.
03. Edmar Morel, Padre Cícero, o Santo do Juazeiro, 2ª ed., Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1966, pp.126 e 127.
04. Luís Sucupira, A Perpétua Fisionomia do Padre Cícero, in Memorial da Celebração do Centenário de Ordenação Sacerdotal do Padre Cícero Romão Batista, Fortaleza, Empresa Editora A Fortaleza, 1970, p. 12.
05. Trecho extraído do Relatório da visita feita ao Padre Cícero pelo Marechal Rondon, a serviço do Governo Federal em 1922.
06. Phillip Von Luetzelberg, Estudo Botânico do Nordeste, Rio de Janeiro, Ministério da Viação e Obras Públicas, 1923, p. 59.
07. Amália Xavier de Oliveira, O Padre Cícero que eu conheci, Rio de Janeiro, 1969, p. 14.
08. Lourenço Filho, Juazeiro do Padre Cícero, 3ª ed., Rio de Janeiro, Edições Melhoramentos, s/d, p. 186.
09. Jáder de Carvalho, apud Helvídio Martins Maia, o.c., p. 52.
10. Otacílio Anselmo, Padre Cícero Mito e Realidade, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1968, p. 62.
11. Edmar Morel, o.c., p. 43.
12. Amália Xavier de Oliveira, o.c., pp. 238, 241,242 e 243.
13. Azarias Sobreira, O Patriarca de Juazeiro, Juazeiro, 1969, pp. 173 e 174.
14. Fernandes Távora, Algo de Minha Vida, apud Azarias Sobreira, o.c., p. 183.
15. Neri Feitosa, O Padre Cícero e a Opção pelos Pobres, São Paulo, Edições Paulinas, 1984, pp. 97 e 100.
16. Antônio Teixeira Junior, revista O Cruzeiro, 6.1.1971.
17. Nertan Macedo, O Padre e a Beata, Rio de Janeiro, Edições O Cruzeiro, s/d, p. 68.
18. Helvídio Martins Maia, o.c., p. 11.
19. Fernandes Távora, O Padre Cícero, Considerações sobre sua Mentalidade e Ação Social, in Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, Ano LVII, vol. 53, 1943, apud Antônio Teles, Padre Cícero nas Pegadas do Mestre, Juazeiro, 1985, pp. 25 e 26.
20. Idem, apud Azarias Sobreira, o.c., p. 181.
21. José Leite Maranhão, Padre Cícero Paranóico. in Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, LXXX, 1966, apud Antônio Teles, o. c., pp. 41 e 47.
22. Antônio Teles, o.c., pp. 32 e 39.
23. Abelardo F. Montenegro, História do Fanatismo Religioso no Ceará, Fortaleza, Editora A. Batista Fontenele, 1959, p. 55.
24. Euclides da Cunha,  Os Sertões, apud Daniel Walker Almeida Marques, O Pensamento Vivo de Padre Cícero, São Paulo, Martin Claret Editores, 1988, p. 56.
25. Otacílio Anselmo, o.c., p 164.
26. Manuel Diniz, Mistérios do Juazeiro, Juazeiro, Tipografia do O Juazeiro, 1935, p. 45.
27. José de Medeiros Delgado, Padre Cícero, Mártir da Disciplina, Documento Pastoral, Fortaleza, 1970, p. 81.
28. Leandro Konder, apud Edmar Morel, o.c., orelha.
29. Helvídio Martins Maia,  o.c., p.187.
30. Ayres de Montalvo, apud Azarias Sobreira, o.c., p. 83.
31. Napoleão Tavares Neves, O Que Penso de Padre Cícero Romão Batista, crônica, 22.7.1991, apresentada na Rádio Progresso de Juazeiro do Norte.
32. Neri Feitosa, o.c., p. 169.
33. Rodolpho Teófilo, A Sedição de Juazeiro, São Paulo, Edição Revista do Brasil, 1922, p. 61.
34. Hélder Câmara, apud Daniel Walker Almeida Marques, o.c., p. 61.
35. Raquel de Queiroz, apud Amália Xavier de Oliveira, o.c., p. 7.
36. Antoine Vergote, Padre Cícero: Santo Popular e Figura Paternal, palestra proferida no I Simpósio Internacional sobre o Padre Cícero e os Romeiros de Juazeiro do Norte, 18.4.1988.
37. Sebastião Negreiro, revista  O Cruzeiro, 10.11.1970.
38. Hermínio B. De Oliveira, Formação Histórica da Religiosidade Popular no Nordeste, São Paulo, Edições Paulinas, 1985, pp. 102 e 103.
39. Maria de Lourdes M. Janotti, O Coronelismo, uma Política de Compromissos, São Paulo, Editora Brasiliense S.A., 1981, p. 73.
40. José Fábio Barbosa da Silva, Organização Social de Juazeiro e Tensões entre Litoral e Interior, in Sociologia, vol. XXIV, n° 3, setembro de 1962, Fundação Escola de Sociologia Política de São Paulo.
41. Rui Facó, Cangaceiros e Fanáticos, 3ª ed., Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1972, p. 161.
42. José Boaventura de Sousa, apud Daniel Walker Almeida Marques, o.c., p. 71.
43. Francisco Régis Lopes Ramos, Caldeirão, Fortaleza, Editora da Universidade Estadual do Ceará, 1991, pp. 101 e 102.
44. Neri Feitosa, o.c., pp. 172 e 173.
45. Daniel Walker, A Importância de Padre Cícero para Juazeiro, palestra proferida no Centro Educacional Professor Moreira de Sousa, 20.04.1984.
46. Otacílio Anselmo, o.c., p. 401.
47. Rodolpho Theophilo, o.c., p. 63.
48. Edmar Morel, O Povo, 7.1.1978, apud Antônio Feitosa, Falta um Defensor para o Padre Cícero, São Paulo, Edições Loyola, 1983, p. 106.
49. Ralph Della Cava, Milagre em Joaseiro, 2ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, pp. 225 e 226.
50. Irineu Pinheiro, O Juazeiro do Padre Cícero e a Revolução de 1914, Rio de Janeiro, Irmãos Pongetti Editores, 1938, p. 168.
51. C. Livino de Carvalho, A Couvada, Egastenia, A Tomada do Crato, Recife, Edições GERSA, 1959, p. 80.
52. Azarias Sobreira, o.c., pp. 213 a 215.
53. Amália Xavier de Oliveira, o.c., pp. 190 e 191.
54. Floro Bartolomeu da Costa, Juazeiro e o Padre Cícero, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1923, p. 89.
55. Otacílio Anselmo, Padre Cícero, Mito e Realidade, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1968, p. 62.
56. Rui Facó, Cangaceiros e Fanáticos, 3ª edição, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1972, p.134.
57. Irineu Pinheiro, O Joaseiro do Padre Cícero e a Revolução de 1914, Rio de Janeiro, Irmãos Pongetti Editores, 1938, p. 170.
58. Ariosto Holanda, Padre Cícero e a Mudança do Ceará-II, in jornal Diário do Nordeste, Fortaleza, 26.03.1994.
59. Mário Souto Maior, Ecólogo ou Futurólogo. in Jornal do Commercio, Recife, 25.03.1994.
60. João Alves de Melo, Mensagem, in revista Memorial, Juazeiro do Norte, março de 1994. 61. Discurso proferido por ocasião do lançamento da revista Memorial, em Juazeiro do Norte, no dia 18.04.1994.


FONTE: Padre Cícero, a sabedoria do conselheiro do sertão, de Daniel Walker