terça-feira, 16 de abril de 2013

Conselheiro e Padre Cícero - Por Marcos José Diniz Silva


Dois cearenses que marcaram seu tempo. Dois cearenses contemporâneos que não se conheceram e, no entanto, lideraram os dois maiores movimentos de religiosidade popular da história do Brasil. Neste mês de março, o Ceará comemora os natalícios desses dois ilustres e polêmicos conterrâneos. Os 180 anos de Antonio Conselheiro e os 166 anos do Padre Cícero. Para o primeiro, sessão solene, conferência e exposição na Assembleia Legislativa. Para o ´santo do povo´, mais um evento anual no Cariri. Essa programação promete rememorar e refletir sobre as trajetórias e significados dessas duas personalidades que até hoje despertam paixões, polêmicas e interpretações de sabores até exóticos. Antonio Vicente Mendes Maciel - o Conselheiro - trilhou o caminho dos andarilhos penitentes e reformadores a sanar as decepções da vida pessoal em celibatária vida mística, apontando o horizonte de bem-aventuranças para o povo esquecido e explorado dos sertões. Após décadas de peregrinação funda, em 1893, comunidade alternativa em fazenda abandonada do interior da Bahia. Cícero Romão Batista, como sacerdote, finca raízes no Cariri, no inexpressivo povoado de Juazeiro, para onde atrairia o povo sedento de pão e de amparo espiritual. Sem entrar, aqui, no mérito dos debates acadêmicos e das opiniões do senso comum sobre os sentidos da comunidade de Canudos e sua destruição pelo governo republicano e, menos ainda, sobre a verdade ou não dos milagres que tumultuaram e projetaram o sacerdócio do ´Padim Ciço´, a partir de 1889; considero mais oportuno, inspirados nessas efemérides, pensar o lugar da religião na constituição da vida social. Poderíamos, então, indagar: Em que medida as trajetórias de vida de Antonio Conselheiro e do padre Cícero configuraram oportunidades de questionamento ou de reforço dos mecanismos de dominação daquela sociedade? De que modo, respectivamente, um leigo e um sacerdote, sob inspiração ou mandato religioso, puseram em questão a ordem sócio-política e hierárquico-religiosa de seu tempo? Por fim, o que era de ´Deus´ e o que era de ´César´ na história desses cearenses?


MARCOS JOSÉ DINIZ SILVA
Historiador e professor universitário

Artigo publicado originalmente no Diário do Nordeste, Debates e Ideias, em 28 de março de 2010

segunda-feira, 15 de abril de 2013

NOSSO CARTÃO POSTAL - Por Eraldo Oliveira



Tu és paradisíaco, histórico e cultural. És paisagístico e de grande beleza cênica. És de um ambiente sociológico e religioso incomensurável, onde o caldeirão da cultura poética se mistura a literatura, a arte popular dos artesãos, dos cantadores, repentistas e cordelista de todos os rincões da língua pátria. És Paisagístico e de grande beleza cênica. És mitológico e sacro pela imponência e importância de um Padre-fenômeno que não se chama Francisco. És Paleontológico por sua formação geológica de conexão com a pré-história. És parque do GeoPark Araripe, onde deixa de ser só Brasil para ser existência real do patrimônio da humanidade. Aflora aqui uma economia forte de identidade e cultura própria. Surge uma nação Kariri. Sobressai daqui o turismo científico, religioso e ecológico. És PARADOXAL e CONTRADITÓRIO, pois sois SAL e AÇÚCAR. 
Sabem por quê? 
És vizinho ao céu pelos mais de 900 m de altitude da Chapada do Araripe, acima do nível do mar. Mas és também subterrânea, uníssona a um oceano primitivo, onde fostes enseada de um lago de água salobra (doce e salgada). Por isto nos destes de depósito uma rica e linda Santana do Cariri/CE, detentora dos "bichos" e "plantas" mais estrambóticos da face da terra. És a maior jazida fossilífera do mundo. Tu és também homem das cavernas, visto que nos destes Nova Olinda/CE, que com sua riqueza litológica de escritas rupestres, coloca-nos frente a frente com o homem pré-histórico. Ainda bem que lá tem a Casa Grande de Alemberg Quindins.
Vou mais além: essa terra aqui é doce, mais muito mais doce que mel. Sabem por quê?
Fica perto do Cratinho de açúcar, nosso doce de buriti. És doce água medicamentosa, de onde jorram fontes d'água que choram pela preservação. Das terras dos verdes canaviais, Barbalha/CE, a cetama do Cariri, és doce límpido mel que escorrem caldo de cana. Do outro lado vizinho nosso, bate a porta a chave do frio da Serra de São Pedro do Caririaçu/CE, o qual rememora o gosto gelado dos antigos engenhos da rapadura da Missão Velha/CE.
Pois bem, espremam a Serra do Araripe que só sai garapa! Aliás, irrompe-se dali, Luiz Gonzaga do Exu-PE, a mais juazeirense das cidades Pernambucanas. De sobra ainda sobressai-se Patativa do Assaré/CE a curruchiar em versos de analfabeto o que a academia abismada acabou por reverenciá-lo. Pelas aulas de Geografia somos divisas com os Estados do Piauí, Pernambuco e Paraíba e uma potência educacional com as diversas Universidades e cursos de ensino superior. Estamos equidistantes em média 700 km de João Pessoa-PB, Natal-RN, Recife-PE, Fortaleza-CE e Teresina-PI, por isso temos um comércio forte e serviços em abundância. Estratégico estamos e hoje mais que metrópole, somos a Capital da fé, do trabalho e dos negócios. 
Pois é, “Ciço” Romão, num raio de menos de 50 km, impulsionaste toda esta riqueza. Tu és forte e continua vivo. Só falta agora o latino Papa Chico reconhecer que a hóstia de sangue era o sal para a igreja que o condenou e o doce mel que escorreu pela boca da Beata Maria que até hoje banha às terras dos Verdes Vales do Cariri Cearense. Teu milagre: Juazeiro do Norte/CE – Brasil. 

Eraldo Oliveira
Escrito em 13/04/2013, às 4:30 da manhã.

domingo, 14 de abril de 2013

ATAQUE VAZIO - Por Geová Sobreira

O jornal O Povo, de Fortaleza, em sua edição de 05.04.2013, na coluna Opinião, publicou, quase como uma Nota, matéria assinada por Marcos José Diniz Silva, criticando vãs esperanças de alguns romeiros, devotos do Padre Cícero, de que o novo Papa, Francisco, venha consagrar às glórias dos altares o Patriarca do Juazeiro. Se o autor da matéria não se intitulasse “historiador” e, principalmente, professor da Universidade Estadual do Ceará sua opinião expressa no jornal cairia rapidamente no total esquecimento.No entanto, como o Sr. Marcos José Diniz Silva intitula-se professor universitário e nessa condição orientador intelectual de novas gerações é que merece alguns esclarecimentos para que não continue semeando e propalando asneiras para seus alunos. A função do magistério é incentivar e aprimorar, entre outras coisas, o desenvolvimento e enriquecimento da reflexão crítica dos educandos. Ora, nesses mais de dois mil anos da Igreja Católica a história registra graves equívocos, erros e até mesmo profundas crises no seio da Cúria, cujo mais notório exemplo é as criminosas execuções provocadas e executada pela Santa Inquisição. É exemplar o inquérito de Santa Joana D’Arc, condenada à morte nas chamas da fogueira, depois elevada às glórias dos altares, tornando às claras que mesmo cabeças coroadas, adornadas de solidéus e mitra, cometeram e cometem no curso da História graves e crassos erros de julgamento. Será que o Sr. Marcos José Diniz Silva teve a curiosidade, como professor de História, de ler a vasta quantidade de análises do Relatório Vatileak , mostrando a aguda crise da Cúria Romana, que obrigou o Papa Bento XVI abdicar do seu pontificado? No final de sua bisonha Nota, que o jornal O Povo deu publicidade, o Sr. Marcos José Diniz Silva, empluma-se de intelectual e com volutas de vaidade ignorantes. Será que esse senhor, que se diz professor de História, leu ao menos 5% (cinco por cento) da bibliografia do Padre Cícero, que hoje atinge quase 15.000 títulos e milhares de teses de doutorado nas mais importantes Universidades do mundo? Será que ele idêntica na História Eclesiástica Brasileira um membro da Igreja Católica, que sendo apenas um humilde capelão de um pobre, esquecido e desprezado povoado, perdido nesses sertões, tenha exercido tamanha influência no seio do catolicismo, que hoje está presente em todos os quadrantes do território nacional? A história oficial do Brasil já despachou para o esquecimento muitos, da elite intelectual e clerical, que se arvoraram em condenar o Padre Cícero e decretar a destruição de sua cidade – Juazeiro. A cidade do Juazeiro é o mais bem sucedido projeto de desenvolvimento integrado da História do Brasil evoluindo de mísero povoado, coito de bandoleiros, de retirantes, de comboieiros, dos excluídos, para a mais importante metrópole dos sertões. Juazeiro é o obra gigantesca de homem que não pejamos de chamá-lo de Santo, tenha ou não tenha o placet da Cúria Romana. Constata-se hoje que a Igreja Católica precisa mais do Padre Cícero, do que o Padre Cícero da Igreja. Vê-se nestes últimos tempos evasão em massa do seio da Igreja Católica, enquanto cresce geometricamente o número dos devotos do Padre Cícero, no Nordeste e em outras regiões do Brasil. É a Fé dos romeiros do Patriarca do Juazeiro que mantém vivo o catolicismo nos sertões nordestinos.Temos plena consciência dessa realidade e até relevamos quando autoridades eclesiásticas buscam Juazeiro não para salvar almas ou aumentar o rebanho de Cristo e sim para se locupletar-se com as esmolas do povo romeiro.Temos orgulho de sermos a Nação Romeira dos devotos do Padre Cícero e já não cansamos de pedir perdão.

Nota do Editor do blog: Este artigo de Geová Sobrera, foi publicado originalmente no www.juanorte.com.br e se reporta ao artigo do professor  Marcos José Diniz  publicado no jornal O Povo e reproduzido também neste blog, logo abaixo.


Recebemos do professor Marcos José Diniz:
Prezado Daniel Walker

Fui surpreendido com um texto do Sr. Geová Sobreira, em seu Blog, a respeito de um artigo meu sobre a reabilitação do Padre Cícero. Gostaria de contar com vossa gentileza em publicar minha réplica ao Sr. Geová,  no seu BLOG DO PADRE CÍCERO.

RÉPLICA

Gostaria de esclarecer ao Sr. Geová Sobreira algumas questões referentes ao seu ácido comentário, intitulado “Ataque vazio”, a repeito de meu artigo de opinião publicado no jornal O Povo (5.4.2013), com o título “Processo de reabilitação do Padre Cícero”.

Expressei no referido artigo a minha opinião de historiador atendendo a uma solicitação da editoria do jornal e, como tal, me dispus a responder sobre a possível reabilitação do Padre Cícero pelo atual papa, Francisco.

Não tencionei julgar méritos ou deméritos pessoais de padre Cícero, nem fazer uma análise histórica da Igreja católica. Apontei uma perspectiva histórico-sociológica do fenômeno ocorrido e do tratamento dado ao padre pela Igreja, concluindo que acho muito improvável que o Vaticano volte atrás em sua condenação ao Padre Cícero.

Não me coloquei como defensor nem como acusador de quaisquer dos lados, como bem pode concluir qualquer pessoa com inteligência mediana e capacidade de interpretar um despretensioso artigo de jornal. Não desmereci nem ao padre, nem aos romeiros, nem à Igreja católica, apenas os tratei na perspectiva analítica.

Que o Sr. Geová apresente seus referidos documentos e milhares de livros sobre o Padre Cícero ao Vaticano. Faço votos de sucesso na reabilitação do mesmo.

Não menos importante, convém lembrar, que além de não compreender as ideias expostas, esse cidadão ainda se deu ao trabalho mesquinho de me atacar como profissional, com sua verborragia de fanático e destemperado, sem qualificação para o debate histórico.

Espero, por fim, que esse cidadão refine seu vocabulário em direção à polidez e procure mirar melhor seus alvos na sua guerra santa em prol da memória do Padre Cícero.

Marcos José Diniz Silva

Fortaleza, 14 de abril de 2013.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Historiador não acredita que Papa Francisco vá reabilitar o Padre Cícero


Historiador não acredita que Papa Francisco vá reabilitar o Padre Cícero Publicado: 05-04-2013 | Autor: Eliomar de Lima | Categoria(s): Blogs O POVO, Brasil, Ceará, Política, Religiao

Com o título “A Reabilitação do Padre Cícero”, eis artigo do historiador Marcos José Diniz Muniz. Ele fala sobre o santo do povo e aposta fichas de que, mesmo com o novo Papa, a Igreja Católica poderá até beatificá-lo, mas nunca reabilitá-lo. Confira:

A eleição do papa Francisco (Jorge Mário Bergoglio), mesmo sendo o primeiro papa latino-americano, não deve alterar a suspensão de ordens do Pe. Cícero. Os fatos considerados “milagrosos”, “extraordinários” ou “embuste”, ocorridos em missa na capela de Juazeiro, em março de 1889, envolvendo a beata Maria de Araújo e o Padre Cícero Romão Batista deram ensejo a negociações políticas e religiosas, pressões populares, investigações eclesiásticas e, finamente sua negativa e punição canônica aos envolvidos no caso, especialmente a suspensão das prerrogativas sacerdotais do Pe. Cícero (1894).

Embora, as romarias e referências ao suposto milagre da transformação da hóstia em sangue na boca da beata tenham sido proibidas oficialmente pela hierarquia católica, a religiosidade popular foi gradativamente canonizando o Pe. Cícero como milagreiro, ao mesmo tempo em que o respaldava em sua ascensão econômica e liderança política local e estadual. Bastando atentar para o acelerado crescimento populacional e econômico daquele vilarejo, levando-o à emancipação política, e às práticas políticas do líder religioso harmonizadas com o modelo coronelístico e oligárquico vigentes.

Assim, ao longo dos anos até sua morte em 1934, consolidou-se a devoção popular ao “Padim” num processo de sua incorporação informal pela ortodoxia católica, que auferiu ao longo de mais de um século de todos os benefícios materiais e simbólicos dessa herança “herética”. Vide doação dos bens do Pe. Cícero aos Salesianos, manutenção e ampliação de irmandades, simbiose da devoção ao “Padim” com os festejos dos santos oficiais até os dias de hoje…

Para o povo, em grande parte ignorante dos complexos meandros teológicos, canônicos e institucionais da Igreja católica, o Padre Cícero continua a ser padre, é o Padim, é um santo. Para a Igreja, reabilitá-lo das ordens é oficializar uma rebeldia já explicitada e condenada, inclusive com excomunhão, o que não fará coerente com sua característica de instituição voltada ao monopólio da dispensa dos bens de salvação.

A Igreja, hoje adaptada, beneficiária e coordenadora dos festejos e culto à pessoa do Padre, porque refém da poderosa força religiosa e política dessa fé do povo, sem jamais entronizá-lo em seus templos, poderá até beatificá-lo, mas muito dificilmente reabilitá-lo no atual papado, como não o fizeram os dez papas anteriores.

* Marcos José Diniz Silva

marcosjdiniz@oi.com.br
Historiador.

Professor da Uece.